Por que escrevo?
Escrevo para não morrer.

(José Saramago)

quarta-feira, 28 de julho de 2010

PROEZAS DO BECO

Entre o beco da alma
e o beco da esquina,
Madalena caminha pela rua,
como a coisa real por fora
da fachada do bar.

Entre o espírito de Madalena
e as águas que moveram Deus,
meu ser rasteja pelo infinito
sem desvendar o mistério
de minhas proezas,
ou dos cacos de mim espalhados
pelo sangue da cigana do véu.

Sei que meu ser não se abre para as reentrâncias
dos caminhos de Madalena apedrejada.
Cumpre-se a sina do beco e da alma
Pois entre mim, as pedras e o beco,
a distância do universo me infinitam.

Sou o espelho das prostitutas órfãs
que os anjos despiram no Éden.
Sou o desejo do esmago
e das crateras infindas de Jesus e Eros
na alcova da mendiga passante.

Entre o beco da esquina
e os pedaços de meu espírito,
a transfiguração da cigana e de Madalena sorri
para meu corpo definhado no retrato do passado.


sexta-feira, 23 de julho de 2010

REGA O VÉU DE TUAS ROSAS

(Ao amigo silencioso, Edelson Santana – Julho/2010).

  

Renuncio-te como se rasga
um véu de cada voz e sem a dor
de uma sangrenta perda.
Perder é um ganhar
de tua ausência dilacerada em mim.
Compreendo o avesso do silêncio
e ainda arranho a voz da tua alma.

Interrompi a música muda e asséptica
da epifânica nostalgia nossa.
É esta canção que em mim ficará
Aquela que o tempo mergulhou
no abandono imensurável.
Minha alma borbulhará ao compasso
de teus passos silenciosos e apressados
como as batidas da marcha de Safo por Anactória.

Renuncio-te como se rasga um véu...
Mas a renúncia é tua e minha será a remissão.
Vê-lo- ei em todas as noites
de clarão e no vago
de teu olhar que em mim ficou.
Acariciarei o descompasso
dos caminhos e espinhos que em teu peito cravei.
 
Segue teu destino e rega o véu de tuas rosas.
Meu jardim será regado pela memória eterna
de teu sorriso esmagado pelas folhas do tempo.
O meu tempo é a eternidade do minuto
como se fosse o retrato itabirano,
estático e mudo,
mas comunicável em mim.