Convergências e tessituras: Manoel de Barros, João Cabral de Melo Neto e Corsino Fortes, originalmente produzido como dissertação de mestrado, é um livro, que, como o próprio título aponta, nasceu da percepção de afinidades entre dois poetas brasileiros e um cabo-verdiano. Tendo a poesia de Melo Neto como foz para onde converge/diverge a poesia dos outros dois poetas, Rosidelma Fraga, com sua sensibilidade de crítica aliada a de poetisa, é leitora do que avulta além da superfície das palavras. Com seu olhar minucioso e investigativo sobre a obra de três grandes poetas, pôde perceber o que neles concorrem para uma poética intertextual. Nessa especulação de uma poesia na outra, é possível fulgurar, em um poeta da exuberância, de versos excedidos de significados, a centelha do cerebralismo cabralino. Barros ajusta a poesia enquanto pensamento antes que sobrevenha à palavra na voz e no papel. E, do outro lado do Atlântico, Fraga foi buscar Corsino Fortes, poeta que ergue a palavra poética da terra e tem nela bandeira de vida de seu povo. Fortes escuta as reentrâncias mais originárias dos dois poetas brasileiros e procura mobilizar em seus poemas a tensão dessa memória de leitura em meio ao que lhe oferece para cantar sua terra.
Fraga fundamenta as tessituras dessa poética com a lição de Antonio Candido: é preciso analisar como funcionam os elementos da comparação na obra dos autores. Dessa forma, além de temas, que convergem/divergem, a autora examina na obra dos poetas o sujeito lírico, o erotismo, a autorreferencialidade poética e os diálogos intertextuais. Tudo isso compõe o gestual poético, emblematizado nas imagens que, por sua vez, se enraizam na natureza, destituídas de peso pelo labor da criação, para ascender pela leveza que Italo Calvino asseverou como uma das qualidades da poesia, que está vindo a ser, desde as últimas décadas do século XX.
Pedras, rios, ilhas e ventos são imagens destituídas na linha do verso de uma geografia física para constituírem geografia de palavras, que solidarizam poetas tão diferentes e tão próximos. O livro que ora vem a público significa mais uma reafirmação da solidariedade que há na palavra poética, sempre generosa, sempre possível de estabelecer encontros. Por sua vez, essa é uma lição da vida, que a própria palavra poética nos ensina constantemente. É o que nos demonstra os trabalhos de literatura comparada, especialmente este de Rosidelma Fraga.
(Profª Drª.Goiandira de Fátima Ortiz de Camargo - Faculdade de Letras -Universidade Federal de Goiás)
2 comentários:
Rosidelma, parabéns pela lucidez acadêmica e poética. A poesia pede passagem na e para a academia. De Barros a Corsino o vórtice da poesia contemporânea, de Cabral ao vértice do modernismo os (des)caminhos da lírica entortada em estado bruto de diamante a ser lapidado pelo leitor. Convergências e tessituras são ensinamentos para uma poética cabra/cursina/manoelina. Rufe os tambores das sonatas entrelaçadas. Continue a tanger a poética comparatista a serviço de uma boa leitura.
Parabéns pelo seu livro!
Um forte abraço do amigo poeta
Obrigada professor e poeta. Só agora li este comentário e fico envaidecida por seu olhar crítico e poético!
Abraço em versos!
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