Por que escrevo?
Escrevo para não morrer.

(José Saramago)

terça-feira, 20 de março de 2012

RÉQUIEM

Cada vez que abro um livro de poemas
Não sei se voltarei a afagá-los
Pode ser que seja meu último instante.

Quando a morte me tocar
Eu não sei que hora ela chegará
Se ela virá toda branca ou toda negra.
A morte não escolhe a cor da pele.
Não sei se ela se curvará diante de mim
Ou se estará nua e de pés no chão.
Não sei se estarei no barro e sem poesia.

Cada vez que escrevo um verso
Pode ser que esteja quase no fim
E pode ser que o poema
vista a roupa com alinhavos.
Disso eu tenho medo imensurável.

Eu nunca temi a morte
Mas o inacabado das coisas
O beijo nunca dado
O abraço que deixei de dar
O perdão que deixei de suplicar
A declaração de amor que ontem guardei
no bolso da blusa preta de cetim.

Que venha a morte galante
No dia que a trombeta tocar.
Que ela seja dócil e espere-me um minuto.
Quero dar o último gole de palavras
Vestir a nudez de minha alma opaca
Ouvir o Réquiem de Mozart
E tocar na flor indesejada do jardim.
O segredo das coisas sensíveis
reina além do avesso invisível.
Já na brevidade do último segundo
Quero embriagar de amores
Grafar a minha história
numa pedra qualquer da esquina
e me esculpir nos versos
de uma silenciosa eternidade.

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